Foto: Claudio Fachel/Palácio Piratini
Estava de folga e a quarta-feira era chuvosa. Mas fiz questão de seguir alguns dos passos de José Alberto Mujica Cordano, presidente da República Oriental do Uruguai, em Porto Alegre. Graças ao jornalismo, o famoso “presidente mais pobre do mundo”, cuja figura já beira o estado mítico para muitos, esteve por cerca de uma hora a poucos metros de mim, no Palácio Piratini.
Com uma história incrível de luta e resistência no passado, Pepe Mujica lidera grandes revoluções neste enorme pequeno país no Sul da América do Sul. Nos últimos cinco anos, tocou em assuntos polêmicos, mudou rotinas e surpreendeu não apenas seu país ao mesmo tempo que mantém uma vida pessoal pacata no periférico bairro Cerro, em Montevidéu.
Por trás de seus óculos escuros no Piratini, Mujica, ao que pareceu, não é chegado aos badulaques do poder. Manteve uma franqueza sábia ao longo de sua fala, dita de improviso, sem discurso pronto. Impressionou pelo conteúdo e pela simplicidade. Por certo não tem razão em tudo o que diz. Mas sua rota proposta, sem dúvida, parece indicar para um mundo melhor. Não à toa foi aplaudido de pé.
Abaixo, um compilado de frases de Mujica em Porto Alegre:
“As causas novas não são outras coisas que um vinho elaborado. A dor e a injustiça humana são velhas como o vento. Temos mais celulares, tiramos mais fotos, mas ainda temos injustiça, dores, diferenças por classes, imposições militares. (…) Então as causas novas têm um alento de outras causas.”
“É preciso criar uma civilização comum na América Latina, que tem como o coração a Amazônia. Mas não juntar-se como o sonho de Bolívar, não. Temos que nos juntar porque juntos somos grandes, é um caráter estratégico. Temos que nos juntar para sabermos nos defender.”
“Temos que cumprir com a gigantesca dívida social que ainda temos. Eles vivem porque nasceram, mas não têm causa para viver. Quando damos uma causa, damos sentido. É preciso ter vontade de viver. Mas viver para servir. (…) A de se viver porque a vida é linda, apesar de tudo.”
“O homem é um primata que necessita acreditar em algo. Se tu estudares todos os povos antigos, verás que eles têm algo em comum: todos acreditam em algo. Uma religião, uma caverna, uma magia, não importa.”
“A civilização que a gente vive coloca o dinheiro e a riqueza na escala mais alta do trunfo humano.”
“Aos que gostam muito do dinheiro, a política deveria os correr. Não que na política não haja interesses. Há interesses, mas não são de dinheiro: são de carinho das pessoas, de entendimento das pessoas. Quando essas coisas se juntam, muda de verdade e a confiança na política.”
“A culpa não é dos políticos e sim dos valores da nossa sociedade, onde quem tem muito dinheiro é quem triunfou. Isto é falso. Não há de se odiar quem tem dinheiro, mas há de se odiar o que se vende.”
“Querido amigo jornalista, eu sou um velho lutador social metido a governante. Não encaixo com o modelo tradicional de presidente. Não tenho culpa. Sou um homem republicano, vivo como vive a maioria do meu povo e não como vive a minoria do meu povo. E tratarei de ser fiel a esta regra por convencimento. Não julgo a ninguém. Tenho amigos de todas as classes sociais. Mas assim como não uso gravata, minha vida tem um rumo. Não altero.”
“Gasto pouco, vivo com pouco, porque quero ser livre não para cuidar das coisas que tenho e sim para fazer as coisas que eu gosto. Meu sentido de liberdade. Mas reconheço que sou um raro e não vou convencer a ninguém.”