Foi um puro acaso, desses que acontecem em viagens, que nos apresentou. Eduardo e nós – eu e meu pai – nos conhecemos em uma lavanderia no canto de uma praça no Porto. Um lugar sem atrativos quaisquer e não muito maior que cozinha de apartamento moderno, por onde se entra e se sai apenas por uma porta.
E é um atrapalhado, o Eduardo. Acionou o funcionamento da máquina, ao custo um tanto salgado de 5,50 euros, sem ter colocado suas roupas para dentro, o que obrigou-o a ver toda aquela água e sabão girando à toa por 27 minutos. Não com muito mais sorte, nós ao lado fizemos o procedimento certo, mas a máquina pifava.
Entre explicações com a dona do local – que demonstrou certa piedade do conterrâneo, permitindo-lhe que fizesse uma nova operação gratuitamente –, calhou-se, então, longos minutos de conversa. Português com um português enrolado, Eduardo gosta de falar, ainda que, imagino eu, provavelmente tenha alguma ideia de que não é sempre compreendido ao todo.
Entre suas histórias, percebeu-se, isso sim, é que o tempo fez mal a Eduardo. Tinha 60 anos neste fim de inverno de 2024, só que parecia um pouco mais, talvez bem mais. Sem saber exatamente como que chegara até ali, imaginei-o um tipo marinheiro aposentado, que talvez tenha ficado meio maluco quando viu-se em terra para sempre.
Conta, faceiro e com um quê de orgulho, que tem um irmão no Brasil. Onde? Não sabe. Em algum lugar do país, talvez próximo do Rio de Janeiro. Eduardo só não é morador de rua, porque vive num albergue, disponibilizado pelo governo português. Conforme frisou, só pode entrar até as 22h30, não tem drogas e tem assistência social.
Para sobreviver, além de pouso, recebe 500 euros, entre aposentadoria e auxílio estatal. O valor é um paradoxo para os interlocutores da vez. Enquanto é pouco, coisa de 60% do salário mínimo português, trata-se de um rendimento superior à média de 26 das 27 unidades federativas do Brasil e que, se não garante uma vida plenamente digna, poderia lhe oferecer um pouco mais de conforto em ares tropicais.
Eduardo, porém, provavelmente jamais fará ideia disso, vivendo seu dia a dia entre as ladeiras portuenses. Tem pouco, vive com pouco. E ainda assim oferece a sua amizade. Disse-lhe para ficar com Deus quando saí. Ele se despediu, então, com um sorriso sincero despontando entre uma barba mal feita e a prestatividade de que, se precisasse de qualquer coisa, estaria à disposição. Ali no albergue.
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