(foi de bike, mas com muita reflexão também)
Prefácio
Teve uma vez que, empolgados com qualquer coisa, eu e o meu primo Gustavo saímos pedalando da casa dele, no Cristal, até a casa da nossa avó, no Menino Deus. Encaramos as ruas, subimos e descemos ladeiras. Enfim, chegamos. Ainda mal adolescente, me ocorreu um pequeno estalo: então a bicicleta também pode ser um meio de transporte.
Capítulo 1
Na minha vida acadêmica e profissional, eu sempre estive à noite. Trata-se de um elemento presente e constante à minha vivência. A noite, tal qual o mar, é algo tão fascinante quanto traiçoeira. É bonita de se frequentar, mas sabe-se lá quais os perigos que se corre em uma empreitada mais profunda. Diverte, assim como exige respeito e impõe receio, conforme a hora passa – no meu caso 22h, 23h, meia-noite, 1h. Muitas das minhas voltas para casa, de moto, eram ágeis, ainda que não totalmente sem riscos ou completamente sem detalhes.
Capítulo 2
2018. E com ele, anos a fio de rotina começaram a ruir por conta da greve dos caminhoneiros. Nem durou muito tempo, foi questão de dias, mas mesmo assim teve gente que resolveu passar longas horas numa fila de posto de gasolina – um lugar que normalmente não gosto de ficar nem 5 minutos. Enquanto muitos precisaram ou queriam ficar perto dos motores de seus carros, deixei o veículo desabastecido na garagem e me fui a pé até a estação mais próxima do BikePoa. Bicicleta, afinal, também era um meio de transporte. Eu lembrei disso.
Capítulo 3
A experiência do ano anterior foi efêmera, mas deixou marcas, mesmo quando a normalidade foi retomada logo em seguida. E o destino me reservou, no ano seguinte, uma bicicleta velha, então esquecida na casa do meu pai. Apesar de algumas ferrugens aqui e ali e uns quantos dentes meio tortos, engrenamos um relacionamento sério. Logo resolvemos, eu e ela, encarar a vida – e a noite.
Capítulo 4
Superada aquela tensão comum no início de cada jornada, entrosamo-nos meses seguintes. E então a bicicleta fez então abrir novas percepções de ruas, bairros, praças, tensionamentos e questionamentos da minha cidade. Ao reduzir minha escala, me encheu de dúvidas e curiosidade, além da sensação de necessidade para não escrever errado – afinal, como jornalista, talvez aquilo que eu publico tenha um certo peso também na construção e no planejamento de uma cidade.
Pedalando, então, cheguei até aqui. Humilde em prédio alheio, disposto a aprender.
Em 2023/1, eu, jornalista, iniciei o curso de mestrado acadêmico em Programa de Pós-Graduação em Planejamento Urbano, da UFRGS – lugar onde tentei entrar mais de uma vez e não consegui ao longo de alguns anos. Não foi bem a imaginada porta da comunicação que se abriu para mim na universidade, mas a vida é abrir e desbravar novos horizontes, em novas escalas.
O exercício acima foi, talvez, o primeiro que fiz oficialmente enquanto aluno do mestrado. Apresentar-se contando uma história, na disciplina de Narrativas Urbanas. Diante de duas dezenas de pessoas desconhecidas, o que eu poderia contar? Resolvi explicar como eu, um jornalista, cheguei àqueles bancos acadêmicos.